sexta-feira, 15 de maio de 2020

Diário de um tempo estranho (10/05/2020)

                                                                                                                                    
EM TARDE DE CONFINAMENTO

Já não beijo nem abraço,
E sinto certo embaraço,
Quando alguém me vem falar.
E eu penso, como é que faço,
Como desato este laço,
Como vou cumprimentar.

Não sei até quando dura,
Esta espécie de censura,
Em que me tapam a boca.
O certo é que se perdura,
Esta vida de loucura,
Decerto vou ficar louca!

Mas como sou educada,
Não querendo ser malcriada,
Tenho que arranjar maneira,
Sem tocar, sem dizer nada,
Desejar boa jornada,
A quem passa à minha beira.

Não basta dizer “Olá
Como vai, como é que está?”
Porque a voz sai abafada,
É gritar ao Deus dará,
Porque do lado de lá,
Decerto não se ouve nada,

Mesmo que me queira rir,
Piscar o olho, sorrir,
O sorriso não existe,
Ninguém me vai ver mentir,
Que às vezes estou a fingir,
Que estou a rir,
Estando triste.

Não sei bem se isto me ajuda,
Cumprimentar como Buda,
Juntando as mãos  num “Namaste”,
Pode ser, Que Deus me acuda,
Alguém dizer “Oh miúda,
O que foi que me chamaste?”


Também tentei várias vezes,
Ir imitando os chineses,
Só fazendo um mesura,
Mas isto de chinesices,
Só tem trazido chatices,
Algumas não tendo cura.

Fazer como antigamente,
Curvar-me elegantemente,
Em vénia palaciana.
Não resulta certamente,
Vão pensar que estou demente
Ou é alguém que os engana.

Bem sei que uma continência,
Seguida de reverência,
Ao bom estilo militar,
É cumprimento de excelência,
Mas precisa eficiência,
Não os consigo imitar.

Muito fiz, muito ensaiei,
No assunto trabalhei,
P’ra arranjar a solução.
Acho que enfim encontrei,
Um modelo que eu achei,
Ideal para a saudação.

Pesei os prós, os porquês,
E creio que desta vez,
Vou seguir um bom caminho!
Faço o que Bordalo fez,
Num gesto bem português,
Imitando o “ZÉ POVINHO”.


                    Set.10.05.2020                                                                                  Maria Luisa

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